quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

A Metamorfose :Franz Kafka

No primeiro capítulo, o autor apresenta a idéia principal , ao apresentar Gregor, um caixeiro-viajante que acorda, um dia, metamorfoseado num inseto monstruoso. Esse início de história retrata a angústia do personagem ao se deparar, repentinamente, com outro Ego até então não revelado, porém não de todo desconhecido de si mesmo. Os “sonhos intranqüilos”, apresentados na primeira frase, sugerem as inquietações interiores e antigas do personagem, que de um instante para outro, explodem sob a revelação de um ser diferente. A história revela a luta travada pelo personagem entre o inconsciente e o consciente, nos valores , interações sociais, afetividade .
Kafka utiliza a simbologia de um inseto para representar a descoberta de uma nova aparência de si mesmo, ou uma “recusa” do próprio ser, demonstrados pela descrição detalhada do corpo do inseto horripilante, do ambiente familiar (casa, quarto, cama, alimentação, higiene, etc.). Através das perguntas que o personagem faz a si mesmo, da conversa interna que trava o tempo todo na história ajuizando valores e pensamentos próprios, o autor consegue demonstrar os conflitos mais prementes do homem-inseto: “o que aconteceu comigo, que tal se eu continuasse dormindo e esquecesse essa tolice, entra dia e sai dia..., acordar cedo deixa a pessoa embotada, o ser precisa ter o seu sono, o mais razoável era sacrificar tudo”, etc. Essas são questões representativas de um inconformismo do personagem com sua realidade de vida, questões que buscam respostas para a irregularidade e a indefinição das coisas que vive. Ao mesmo tempo, a importância do papel da família (pai, mãe e irmã), como suporte de segurança emocional, e o desmonte desse suporte após a ineliz transformação; a grande ruptura do eu antigo (menino, infantil e temente ao pai) para o surgimento de um eu novo (metade diferente, metade conformado, maturizado). O livro aborda a rotina familiar como o cenário da história, mas principalmente o cenário de um quarto, como o ambiente específico onde se desenrola todo o processo de transformação. Nesse ambiente particular, o personagem dá vazão à decrepitude mental, e nela agoniza completamente só. A ausência de um socorro ou conforto o leva a reconhecer-se como estranho ao próprio lar, desembocando num desfecho fatal.
O autor se preocupa em demonstrar a fragilidade humana, e ao mesmo tempo o poder de transformação, que é um processo solitário e individual. O questionamento é múltiplo e interno, as pessoas ao redor não conseguem acompanhar nem interpretar o que se passa na mente do personagem, deixando-o minguar à própria sorte. Expressões como: “a maçã ficou alojada na carne como uma recordação visível”, ou “a ferida nas costas de Gregor começou a doer de novo”, “sua atual figura triste e repulsiva”, “sentia-se simplesmente cheio de ódio pelo mau tratamento”, “Gregor não respondia nada, ficava imóvel em seu lugar”, etc., demonstram a dor do personagem ante o comportamento da família. As interações sociais são mostradas como relações onde o ser humano nem sempre é visto por dentro, sobejando juízos e críticas externas, e muito pouca atenção às problemáticas individuais. Para exemplificar, o gerente, os inquilinos, as empregadas, os conhecidos, e os membros da própria família, são peças representativas dessas interações, onde o “inseto”, demonstrava repulsa, etc. Paralelamente, em todo desenrolar da história, as questões materiais também importavam como determinantes de sofrimento, quando o personagem indagava sobre a sua situação financeira familiar. As suas condições de sobrevivência e outros aspectos dessa relevância, como o sustento, o reconhecimento social, a admiração alheia, enfim, a importância que o personagem dava à atuação e ao papel do ser humano no mundo material e social. Ao final, o personagem passa a desinteressar-se completamente pela vida que a ele se apresenta, não vendo nela mais sentido, pois se vê como um animal, um “isso” perante sua família, um estorvo, um tormento que precisava desaparecer. O personagem morre por absoluta tristeza.
Permaneceu nesse estado de meditação vazia e pacífica até que o relógio da torre bateu a terceira hora da manhã. Depois, sem intervenção de sua vontade, a cabeça afundou completamente e das suas ventas fluiu fraco o último fôlego”. Gregor ainda,“Pensou na família com ternura e amor”.




Franz Kafka nasceu em 3 de julho de 1883, em Praga, cidade que na época pertencia à monarquia austro-húngara. Filho de um abastado comerciante judeu, Kafka cresce sob as influências de três culturas: a judaica, a tcheca e a alemã.
Formado em direito, trabalhou sempre em cargos burocráticos. Solitário, com a vida afetiva marcada por irresoluções e frustrações, Kafka nunca atingiu fama ou fortuna com seus livros, na maioria editados postumamente
Morreu no dia 3 de junho de 1924, num sanatório perto de Viena, onde internara-se com tuberculose. Desde então, seu legado -resgatado pelo amigo Max Brod- exerce enorme influência na literatura mundial.

Pensando:

"Aqueles que amamos nunca morrem; apenas partem antes de nós." (A. Nervo)